Julho de 2016. O verão começa como tantos outros: inicia-se a época balnear, ouvem-se noticias de alguns acidentes de mergulhos mal dados e incêndios florestais que começam a surgir aqui e ali... Agosto de 2016. O verão decreta-se o mais assustador de sempre. Portugal está em chamas e até uma ilha ardeu. Agosto de 2026. Por esta altura espero já ter pelo menos um filho e, por esta altura, ele estará, talvez, a aprender a "História de Portugal". Tenho a certeza que me vai perguntar pelo "verão de 2016", como eu perguntei, à minha mãe, pelo 25 de Abril de 1974 e eu espero saber onde encontrar este texto, porque isto é o que lhe vou querer contar: |
Num dia desse verão acordei às 5h da manhã. Não estava de férias, mas podia ter acordado 3h depois. Mas o cheiro a fumo dentro de casa era tanto, que tive que me levantar, para ver se não estava nada a arder ali por perto. E não estava, era o fumo dos incêndios que estava a chegar à minha janela. E não consegui voltar a dormir, tinha a cabeça às voltas com imagens de sítios onde já tinha estado repletos de chamas, imagens de pessoas agarradas à cara a chorar, por terem ficado sem casa, sem pertences, algumas sem alguém da família... Fiquei para ali, deitada, a pensar se fosse comigo e eu, que não tenho medo de quase nada, temi o pior.
Nesse dia, custou-me muito a arranjar-me de manhã, a comer, tudo era insuportável, porque não conseguia respirar. Nas noticias da manhã viam-se casas desfeitas pelo fogo, e pessoas que olhavam sem expressão na cara e diziam coisas como "Deus nos ajude", ou "que desgraça menina, que desgraça". Eram 9h da manhã e não conseguia sair de casa, parecia que parar de ver o que estava a acontecer era desrespeitar e não ser solidária com as pessoas que estavam a passar por aquilo tudo. Quando finalmente sai, achei que me ia sentir melhor. Até que vi o céu, com um tom cinzento alaranjado e o sol vermelho, tal era a fumarada que ali havia. Tive que esfregar os olhos umas 7 vezes até chegar ao carro, de tão doloroso que era aquele fumo todo na cara e, quando cheguei, fiquei perplexa com a quantidade de cinzas que tinha nos bancos, no volante, etc.
Foi um dia de trabalho perdido, esse. De minuto a minuto lá ia eu, ver se havia mais noticias sobre os sítios a arder. E havia, havia sempre: ora era uma nova mata, ora outro incendiário que tinha sido apanhado, mas deixado em liberdade (acredita, que é verdade), ora eram os países todos, de todo o lado, que estavam a enviar reforços, ora era o Presidente da República, que tinha, solidariamente, abraçado pessoas em lágrimas com a situação... As noticias não acabavam, e de hora para hora, de dia para dia só pioravam.
Nesse dia, custou-me muito a arranjar-me de manhã, a comer, tudo era insuportável, porque não conseguia respirar. Nas noticias da manhã viam-se casas desfeitas pelo fogo, e pessoas que olhavam sem expressão na cara e diziam coisas como "Deus nos ajude", ou "que desgraça menina, que desgraça". Eram 9h da manhã e não conseguia sair de casa, parecia que parar de ver o que estava a acontecer era desrespeitar e não ser solidária com as pessoas que estavam a passar por aquilo tudo. Quando finalmente sai, achei que me ia sentir melhor. Até que vi o céu, com um tom cinzento alaranjado e o sol vermelho, tal era a fumarada que ali havia. Tive que esfregar os olhos umas 7 vezes até chegar ao carro, de tão doloroso que era aquele fumo todo na cara e, quando cheguei, fiquei perplexa com a quantidade de cinzas que tinha nos bancos, no volante, etc.
Foi um dia de trabalho perdido, esse. De minuto a minuto lá ia eu, ver se havia mais noticias sobre os sítios a arder. E havia, havia sempre: ora era uma nova mata, ora outro incendiário que tinha sido apanhado, mas deixado em liberdade (acredita, que é verdade), ora eram os países todos, de todo o lado, que estavam a enviar reforços, ora era o Presidente da República, que tinha, solidariamente, abraçado pessoas em lágrimas com a situação... As noticias não acabavam, e de hora para hora, de dia para dia só pioravam.
11 de Agosto de 2016. Hoje vivo aquela, que um dia será, a "História de um país em chamas". A minha casa não ardeu. Nada do que é meu ardeu. Apenas o meu país. O meu país está a arder.
Things we lost to the flames Things we'll never see again All that we've amassed Sits before us, shattered into ash These are the things, the things we lost The things we lost in the fire (Bastille) | |